por Roberto Zapotoczny Costa
A origem histórica do recurso da blindagem remonta de séculos passados o qual foi empregado a partir do momento em que o homem percebeu que apenas as habilidades da luta não eram suficientes para fazer frente às agressões cada vez mais modernas pelas armas de ataque. Surgiram as armaduras para os soldados e seus cavalos (atualmente coletes a prova de balas e blindagens veiculares) além das fortalezas dos castelos e muros (atuais blindagens arquitetônicas) e escudos protetores (ainda em utilização pelas polícias e vigilância patrimonial em alguns empreendimentos).
A utilização do aço e da pedra foram os primeiros recursos de matérias primas empregados na construção desses sistemas de proteção pessoal e coletiva. Tente imaginar o peso dos elmos e das armaduras. Imagine o peso que os cavalos deveriam suportar, além do cavaleiro. Os engenheiros civis haviam de se preocupar sobremaneira com os alicerces dos muros, suas fundações, colunas e mão de obra especializada, além do tempo para execução. Não é à toa que temos locais históricos e materiais empregados pelos exércitos que estão praticamente íntegros e disponíveis para visitação pública nos museus de diversos países, principalmente na Europa.
Há que considerarmos que a evolução das táticas criminosas ao longo do tempo vem impulsionando o desenvolvimento de recursos de proteção que tentam dissuadir ou mesmo impedir a concretização de eventuais ameaças às pessoas ou ao patrimônio, quer sejam públicos ou privados.
Especificamente na blindagem veicular, inicialmente tínhamos um peso agregado nos veículos em aproximadamente 300 kg, isto no início da década de 90. Um mesmo veículo blindado atualmente receberá a metade desse peso, algo próximo de 150 kg para um veículo sedan de médio porte. Para um veículo SUV (Sport Utility Vehicle) pode chegar a aproximadamente 200 kg. Os materiais utilizados na blindagem foram sendo objeto de constantes estudos para alívio de peso e de maneira que produza menos agressão a estrutura original dos veículos. A Audi, em 2018 lançou um veículo blindado de fábrica, a Q5 Security, cujo peso agregado é de 430 kg, utilizando em praticamente todo o veículo o aço balístico. Um pouco na contramão do que apregoam as blindadoras, mas que busca alta qualidade na proteção dos passageiros.
Os materiais de blindagem são classificados em opacos e translúcidos. Os opacos são aqueles não possíveis de serem vistos pelo lado de fora do veículo, pois estão aplicados entre a carroceria e os demais itens do veículo (portas, painel, teto etc). São utilizadas mantas de Aramida (o mesmo material utilizado nos coletes a prova de balas). Já os translúcidos referem- se aos vidros. Ainda pode ser utilizado o aço balístico para proteger áreas mais sensíveis do veículo, geralmente maçanetas, colunas A, B e C, espelhos retrovisores e ainda aqueles espaços onde as mantas de Aramida se encontram com os vidros. É necessário que recebam um reforço nessas junções (aproximadamente 40 mm), de maneira que eventuais projéteis encontrem o vidro, a aramida ou uma placa de aço. Materiais justapostos não conseguem impedir o seu ingresso, já os sobrepostos, por isto pelo menos 40 mm, já dão conta de proteger esses acessos. Esta proteção recebe o nome de overlap.
O peso que cada recurso destes agrega ao veículo é de aproximadamente 70% nos vidros e o restante nas áreas opacas. Considerando um veículo que recebeu 150 kg de sobrepeso, estamos nos referindo em aproximadamente 105 kg nos vidros e 45 kg para as partes opacas. Devemos lembrar que a aplicação da blindagem fará com que o veículo esteja mais pesado na sua parte superior, o que se traduzirá em interferência na sua instabilidade, principalmente em curvas, onde as transferências de carga laterais são mais acentuadas.
Além da interferência na estabilidade do veículo teremos a presença de desgaste prematuro em outros itens do veículo: freios, suspensão, pneus, máquinas de levantar vidros, dentre outros. Você deve estar pensando que o peso de 150 kg é equivalente ao peso de duas pessoas de 75 kg, mas não podemos considerar essa relação dessa maneira. Estamos agregando 150 kg os quais estarão presentes no veículo o tempo todo, e na parte superior do veículo, além dos pesos variáveis dos ocupantes. Obviamente o veículo não foi projetado para uma modificação tão grande na sua estrutura e isto se revelará nas manutenções preventivas e corretivas.
Uma blindagem veicular pode ser realizada basicamente de duas maneiras, de fábrica ou por processo de montagem. A primeira consiste em aplicar os recursos de blindagem ainda no processo de produção do veículo, enquanto que a segunda é realizada após o veículo já pronto e entregue pela fábrica.
Quando um veículo recebe o recurso de blindagem ainda no processo de fabricação, já foi considerada no seu projeto a recepção dos materiais de proteção. Como os vidros são mais largos que os originais, a porta já é preparada para receber um vidro mais pesado e espesso. Ao mesmo tempo a máquina de levantamento de vidro é diferente. Da mesma maneira o veículo recebe um set-up ajustado para incorporar os demais itens. Praticamente inexiste a sensação de insegurança quanto à estabilidade ao dirigir um veículo blindado de fábrica. Poucas fábricas operam com esse tipo de produto, atualmente temos a BMW e Audi mais presentes nesse segmento de mercado.
O veículo blindado por montagem é todo desmontado e tem os seus vidros substituídos, são aplicados materiais opacos e o veículo é remontado. A sensação ao dirigir um veículo sedan blindado por este sistema não altera tanto, mas é perceptível. Há que se considerar que houve forte interferência na sua originalidade, e o seu set-up já não é mais o mesmo. Já em um veículo de centro de gravidade mais elevada que os sedans, a sensação provocada pelas alterações é altamente perceptível, chegando a gerar insegurança ao dirigi-lo, em muitos casos.
Em termos de proteção balística, tanto um quanto outro protege da mesma maneira, já que os materiais de blindagem utilizados são praticamente os mesmos. A diferença consistirá, portanto, na sua dirigibilidade e na manutenção. Atualmente são muito poucas fábricas que oferecem o veículo blindado ainda na sua produção, além de que os que são oferecidos pertencem a classe de veículos do segmento Premium, ainda inacessíveis financeiramente para a grande maioria das pessoas que optam pela utilização de veículos blindados.
Mas, quando se fala em proteção contra tiros, é importante que se saiba que qualquer blindagem veicular de uso civil busca proteger os ocupantes do veículo e não o próprio veículo.
Assim, o motor não recebe proteção, nem o porta-malas muito menos o assoalho. Normalmente a blindagem é aplicada entre o painel e o motor; teto; atrás do banco traseiro dos passageiros e pneus. Qualquer outro local pode ser protegido, mas como blindagem adicional (bateria, tanque de combustível, motor, porta-malas, assoalho).
Os pneus podem ser protegidos de duas maneiras. Uma é a aplicação de uma cinta nas rodas. Caso o pneu receba algum disparo por arma de fogo, ou seja, perfurado de alguma maneira, vai esvaziar e, caso o motorista continue rodando (esta é a recomendação em caso de assaltos), o mesmo vai detalonar (sair da roda), mas a cinta que foi aplicada na roda permitirá o deslocamento até aproximadamente 80 km/h por uma distância média de 50 km.
A outra maneira é a utilização de pneus run flat. Estes pneus são presos nas rodas e, em caso de perfuração e esvaziamento não vai detalonar, será mantido na roda e permitirá deslocamentos da mesma maneira que o sistema anterior.
Os vidros são constituídos basicamente por 2 materiais (placas de vidros e placa de policarbonato). O material mais duro (vidro) é responsável pela diminuição da velocidade do projétil e o policarbonato responde pela diminuição dos efeitos da onda de choque (como uma pedra jogada no lago e que forma aquelas ondas), por ser mais flexível.
O material opaco formado pela manta de aramida é flexível e, como o projétil se desloca em movimento helicoidal (como uma hélice) e em rápida velocidade, ao ter contato com as partes duras do veículo (o que provoca o seu amassamento), diminui a sua capacidade de perfuração (e velocidade) e por fim é contido pelas tramas dos tecidos da aramida, altamente resistente no ponto de contato do projétil.
Já as placas de aço funcionam como reforços entre um material e outro e, por serem extremamente duros, não permitem a sua perfuração de acordo com o grau de proteção empregado no veículo.
O grau de proteção do veículo se refere a quais tipos de armamentos e projéteis cada um pode proteger. Foram criadas algumas normas para padronização da aplicação de blindagens veiculares. Temos a norma americana (NIJ – National Institute of Justice), uma das mais seguidas nas Américas e a norma européia (DIN – Deustche Industrie Norm), além de outras.
Os níveis permitidos para uso civil são NIJ-I, NIJ-II, NIJ-IIA, NIJ-IIIA e os da norma DIN (B1, B2, B3, B4 e B5). Todas estas protegem, conforme o seu grau de proteção, os calibres menores (22) até o 44 Magnum. Acima desses calibres vem os fuzis, de uso restrito, são as normas NIJ– III, NIJ-IV, B6 e B7. Os carros-fortes no Brasil são blindados de acordo com essas normas.
Recomendações importantes para utilização do recurso de blindagem veicular:
Auditar o processo de blindagem para certificar-se de que todas as áreas do habitáculo estejam protegidas. Ao término do serviço de blindagem verificar existência de barulhos, funcionamento de todo pacote eletrônico de fábrica e acompanhar a avaliação de infiltração de água.
Certificar-se de que possui todos os documentos e autorizações expedidas pelo Ministério do Exército.
Realizar o reset-up do veículo por empresa especializada (consiste em atribuir uma nova tabela de alinhamento de câmber e cáster pós-blindagem). Este procedimento fará com que o veículo esteja mais próximo da configuração de fábrica, caso a opção seja por utilizar o sistema de montagem.
Por fim o usuário deve receber um treinamento de Direção Defensiva e Evasiva para adaptar sua maneira de dirigir para condições sociais de violência urbana. Dessa maneira conseguirá potencializar o recurso de proteção da blindagem.
Caso queira saber mais sobre o assunto recomendamos acessar o site da ABRABLIN – Associação Brasileira de Blindagem (www.abrablin.com.br) e verificar os estudos realizados pelas suas câmaras setoriais.
Por fim, a utilização de recursos de proteção como este deve estar atrelada a uma criteriosa e bem elaborada Análise de Riscos a qual definirá o melhor tratamento e alternativas de investimento em segurança, quer seja para utilização particular ou corporativa.
Gostei da matéria ampla e esclarecedora! Alguns detalhes necessitam de uma correção, porém, no contexto geral aborda muito bem temas polêmicos! 👏👍